EM ALGUNS MOMENTOS , EM RODAS DE AMIGOS, RESOLVI DIZER QUE SONHAVA EM VIAJAR POR TODO O BRASIL E DEPOIS POR TODA A AMÉRICA LATINA ANTES DE CONHECER AS OUTRAS PARTES DO MUNDO (SE TIVESSE CONDIÇÕES). AS REAÇÕES FORAM DIVERSAS, MAS UMA RESPOSTA AO QUE EU DISSE ME CHAMOU MUITO ATENÇÃO. A PESSOA DISSE: “MAS O QUE VC VAI ACHAR NESSES PAISES QUE SÓ TEM GENTE POBRE ? O BOM MESMO É IR PRA LONDRES, PARIS, NEW YORK. ISSO SIM É CIVILIZAÇÃO”. APÓS ESCUTAR ISSO, PASSEI A REFLETIR SOBRE A CULTURA E O POVO LATINOAMERICANO, NÃO SÓ O BRASILEIRO.
POIS EU DIGO, NÃO É PRECISO IR A EUROPA PRA “SENTIR O CHEIRO DA CULTURA” – COMO JÁ ESCUTEI TAMBÉM. O POVO DA NOSSA TERRA É RICO E POSSUI UMA CULTURA ATÉ MESMO DIGNA DE INVEJA. A FORMAÇÃO CULTURAL BRASILEIRA SE DEU COM BASE NA MISTURA DE TRES POVOS: INDIGENAS, AFRICANOS E EUROPEUS (SOBRETUDO LUSITANOS). DESSA MISTURA SURGIU UMA CULTURA EXTREMAMENTE RICA. EM QUE OUTRO PAÍS PODE-SE ENCONTRAR RELIGIÕES DE MATRIZES AFRICANAS EM QUE ORIXÁS TOMAM FORMAS DE SANTOS CATÓLICOS?
A PARTIR DISSO, CONSEGUI FORMULAR O QUE RESPONDERIA A PESSOA QUE ME DISSE O QUE RELATEI ANTERIORMENTE. QUANDO DESEJO VIAJAR, EU TENHO O INTUITO DE CONHECER MUITO MAIS DO QUE CONSTRUÇÕES, DESEJO VER AS PESSOAS. CONHECER COMPORTAMENTOS DIFERENTES, MODOS DE PENSAR DIFERENTES E APRENDER COM O DIFERENTE A CONSTRUIR MEU PRÓPRIO MUNDO, MINHA PRÓPRIA CONSCIENCIA. SE PRA MUITOS BASTA VER OS PREDIOS E AS LUZES DA TIME SQUARE, PARA MIM NÃO É O SUFIENTE. MUITO MAIS DO QUE FAZER COMPRAS NO EXTERIOR EU QUERO CONHECER CADA POVO SOFRIDO, MAS ALEGRE QUE HABITA O SUL DA LINHA DO EQUADOR!
Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.
A gente se acostuma a morar em apartamento de fundos
e a não ter outra vista que não seja as janelas ao redor.
E porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora.
E porque não olha para fora logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas.
E porque não abre as cortinas logo se acostuma acender mais cedo a luz.
E a medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora.
A tomar café correndo porque está atrasado.
A ler jornal no ônibus porque não pode perder tempo da viagem.
A comer sanduíche porque não dá pra almoçar.
A sair do trabalho porque já é noite.
A cochilar no ônibus porque está cansado.
A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.
A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra.
E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja número para os mortos.
E aceitando os números aceita não acreditar nas negociações de paz,
aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.
A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir.
A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta.
A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita.
A lutar para ganhar o dinheiro com que pagar.
E a ganhar menos do que precisa.
E a fazer filas para pagar.
E a pagar mais do que as coisas valem.
E a saber que cada vez pagará mais.
E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e a ver cartazes.
A abrir as revistas e a ver anúncios.
A ligar a televisão e a ver comerciais.
A ir ao cinema e engolir publicidade.
A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.
A gente se acostuma à poluição.
As salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro.
A luz artificial de ligeiro tremor.
Ao choque que os olhos levam na luz natural.
Às bactérias da água potável.
A contaminação da água do mar.
A lenta morte dos rios.
Se acostuma a não ouvir o passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães,
a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais para não sofrer.
Em doses pequenas, tentando não perceber, vai se afastando uma dor aqui,
um ressentimento ali, uma revolta acolá.
Se o cinema está cheio a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço.
Se a praia está contaminada a gente só molha os pés e sua no resto do corpo.
Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana.
E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo
e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele.
Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se
da faca e da baioneta, para poupar o peito.
A gente se acostuma para poupar a vida que aos poucos se gasta e, que gasta,
de tanto acostumar, se perde de si mesma.
Só uma coisa a declarar: eu ainda vou ter uma personalidade como a desse Antônio Abujamra.
Pra quem não conhece esse espetacular entrevistador, pode assistir o Programa Provocações na TV Cultura (Às Terças, às 23h) ou na Rede Minas (Aos Sábados, às 23h).
A música do grandioso compositor e cantor brasileiro Lenine se tornou o título do blog: Jack Soul Brasileiro. Esse título remete a três interpretações. A primeira seria a idéia de "já que sou brasileiro", a segunda seria a referência feita por Lenine a Jackson do Pandeiro - fonte de inspiração do cantor. Além disso, há a referência ao Soul dos EUA. Por isso, por ser a mistura de vários elementos e representar a essência miscigenada do povo brasileiro que escolhi essa música pra ser a bandeira carregada aqui.
Com relação a obra utilizada no plano de fundo do blog, acho que ela reproduz exatamente o que o quero dizer: existe um povo plural e maravilhoso que habita essa terra brasileira. Tarsila do Amaral, pintora que admiro desde o momento que conheci suas obras, conseguiu utilizar seus conhecimentos vanguardistas adquiridos na Europa para construir uma arte originalmente brasileira. Como se não bastasse a arte belíssima, Tarsila e outros importantes modernistas, conseguiram exportar o Brasil para o resto do mundo por meio de suas produções, permitindo que outros continentes conhecessem a arte tupiniquim!